Read Ebook: O congresso de Roma (Conferência realisada pelo delegado portuguez do congresso do livre-pensamento) by Lima S De Magalh Es Sebasti O De Magalh Es
Font size:
Background color:
Text color:
Add to tbrJar First Page Next Page Prev Page
Ebook has 125 lines and 12405 words, and 3 pages
Os paizes onde a Egreja ? livre, mas subsidiada e privilegiada, s?o a Belgica, a Hollanda e o Luxemburgo.
Pela separa??o da Egreja do Estado, cessam os subsidios, os ordenados, os salarios, as indemnisa??es, e os auxilios concedidos ao clero, a qualquer culto, ou a qualquer institui??o religiosa.
O projecto Combes deixa ?s associa??es o usofructo gratuito dos edificios do culto, durante dois annos. Outros mais radicaes desejariam o immediato arrendamento das egrejas a longo praso ou a venda em hasta publica. Mas tornava-se indispensavel, no interesse da causa liberal, que a transi??o fosse, quanto possivel, moderada, e em harmonia com as circumstancias de momento.
Como o projecto Combes reflecte, mais ou menos, os principios proclamados no Congresso de Roma, com o applauso dos liberaes e dos democratas de todos os paizes, publicamos em seguida algumas das suas disposi??es geraes.
Artigo 1.?--A partir do 1.? de janeiro que se seguir ? promulga??o da presente lei, s?o e ficam supprimidos: todas as despezas publicas para o exercicio ou manuten??o de qualquer culto; todos os ordenados, indemnisa??es, subsidios ou auxilios concedidos aos ministros de qualquer culto, pelos fundos do Estado, dos departamentos, das communas ou dos estabelecimentos hospitalares publicos.
Art. 2.?--Durante dois annos, a partir do 1.? de janeiro, que se seguir ? promulga??o da presente lei, ser? deixado ?s associa??es o usofructo gratuito dos edificios do culto.
Decorrido este periodo de tempo, cessar? o direito de usofructo gratuito dos edificios religiosos: cathedraes, egrejas, capellas, templos e synagogas, bem como dos edificios de seminarios e de habita??o, arcebispados, presbyterios, postos ? disposi??o dos ministros dos cultos pelo Estado, pelos departamentos e pelas communas.
Art. 3.?--Os bens mobiliarios e immobiliarios pertencentes ?s confrarias, fabricas, consistorios, conselhos presbyteriaes e outros edificios publicos destinados aos cultos anteriormente reconhecidos, ser?o concedidos, a titulo gratuito, ?s associa??es que se formarem para o exercicio de um culto, nas antigas circumscrip??es ecclesiasticas em que se encontrarem esses bens.
Estas concess?es que s? ter?o effeito a partir do 1.? de janeiro que se seguir ? promulga??o da presente lei, ser?o feitas dentro dos limites das necessidades d'estas associa??es, por decreto do Concelho de Estado ou por alvar? prefeitoral, segundo o valor d'esses bens se elevar ou n?o a dez mil francos, por um periodo de dez annos, e com o encargo de dar conta d'elles ao expirar esse periodo. As concess?es poder?o ser renovadas nas mesmas condi??es por periodos de egual ou menor dura??o.
N?o poder?o ser incluidos n'estas concess?es: 1.? os predios provenientes de doa??es ao Estado, que voltar?o a pertencer-lhe; 2.? os bens destinados a um fim caritativo, que ser?o concedidos por decreto do concelho de Estado ou por alvar? prefeitoral, segundo a distinc??o acima preceituada, a estabelecimentos situados na communa ou na circumscrip??o.
Os bens n?o concedidos no praso de um anno, e aquelles cuja concess?o n?o tenha sido pedida de novo, ser?o destinados, da mesma f?rma, aos estabelecimentos de assistencia acima visados.
Art. 4.?--Os ministros dos cultos, que, pela applica??o da presente lei, deixarem de exercer func??es retribuidas pelo Estado, receber?o as seguintes pens?es e subsidios:
Os ministros dos cultos protestante e israelita, os directores e professores dos seminarios d'estes cultos ter?o as mesmas pens?es e subsidios que os parochos e coadjuctores, segundo as distinc??es acima citadas e mediante taxas calculadas nas mesmas propor??es em rela??o aos actuaes ordenados.
Os arcebispos e bispos, e o gran-rabino do Consistorio central, ter?o um subsidio de 1:200 francos.
Estas pens?es e subsidios cessar?o de direito no caso de condemna??o a pena afllictiva ou infamante, ou por qualquer dos delictos previstos nos artigos 17 e 19 da presente lei.
As condi??es de pagamento d'estas pens?es e subsidios bem como todas as medidas tendentes a assegurar a execu??o do presente artigo, ser?o determinadas por um regulamento de administra??o publica.
Art. 5.?--Os edificios e outros bens destinados aos cultos anteriormente reconhecidos, e que pertencerem ao estado, aos departamentos ou ?s communas, ser?o concedidos, a titulo oneroso, a associa??es que se formarem para o exercicio de qualquer culto, nas antigas circumscrip??es ecclesiasticas em que se encontrarem esses bens.
Essas concess?es, que s? come?ar?o a vigorar a partir do 1.? de janeiro que se seguir ? promulga??o da presente lei, ser?o feitas a dentro dos limites das necessidades d'essas associa??es, por decreto do conselho de estado ou por alvar? prefeitoral, conforme esses bens pertencerem ao estado, aos departamentos ou ?s communas, por um periodo de dez annos, com o encargo de darem conta d'ellas ao expirar o praso, e de terem a seu cargo as despezas de conserva??o e grandes repara??es.
Poder?o ser renovadas, nas mesmas condi??es, por periodos da mesma ou menor dura??o.
O pre?o da concess?o n?o poder? exceder a decima parte das receitas annuaes da associa??o, verificadas segundo as disposi??es do artigo 9? da presente lei.
Para as grandes repara??es poder?o ser concedidos subsidios aos departamentos e ?s communas, dentro dos limites do credito inscripto annualmente no or?amento do ministerio do interior.
Os bens n?o reconhecidos uteis para as necessidades das associa??es d'um culto, ou cuja concess?o n?o tenha sido pedida de novo, poder?o, sob as mesmas f?rmas, ser concedidos a outro culto ou destinados a algum servi?o publico.
Os conselhos municipaes e os conselhos geraes ser?o chamados a dar parecer sobre as concess?es de bens, communaes e departamentaes.
As associa??es formadas para occorrer ?s despezas da manuten??o de qualquer culto, n?o ficar?o sujeitas ?s demais prescrip??es d'esta lei, sob reserva das seguintes disposi??es:
Dever?o ter por fim exclusivo o exercicio dum culto, n?o podendo empregar estrangeiro algum no exercicio d'esse mesmo culto.
Os seus administradores ou directores dever?o ser franceses, estar do goso dos seus direitos civis e terem o seu domicilio no cant?o onde se encontrarem os edificios consagrados ao exercicio do culto.
As cerimonias de um culto, prociss?es ou quaesquer outras manifesta??es religiosas nunca poder?o realisar-se na via publica, nem em nenhum logar publico, com excep??o das cerimonias funebres, nem em qualquer edificio publico, al?m dos que forem concedidos a um culto. ? prohibido para o futuro erigir ou collocar qualquer emblema religioso em monumentos publicos ou em qualquer logar publico com excep??o dos edificios concedidos para o exercicio de um culto dos terrenos das sepulturas privadas dos cemiterios, bem como dos museus ou exposi??es publicas.
As reuni?es para a celebra??o de um culto s? poder?o ter logar precedendo declara??o feita nas f?rmas e condi??es da lei.
? prohibido servir-se do edificio destinado a um culto, para n'elle effectuar reuni?es politicas.
S?o punidos com multa de 100 a 1:000 francos e pris?o de seis dias a tres mezes, ou d'uma s? d'estas penalidades, os que, ou por amea?as ou por abusos da auctoridade, ou fazendo temer a outrem a perda de um emprego ou qualquer prejuizo ? sua pessoa, familia ou fortuna, tiverem tentado constranger ou impedir uma ou mais pessoas ao exercicio de um culto, a concorrer para as despezas do mesmo, celebrar certas festas, observar tal ou tal dia de repouso, e, por conseguinte, abrir ou fechar as suas officinas, lojas ou armazens, fazer ou abandonar determinados trabalhos.
Todo o ministro de um culto que, nos logares onde se exercer esse culto, tiver, por meio de discursos proferidos, leituras feitas, escriptos distribuidos ou cartazes expostos ao publico, ultrajado ou diffamado um membro do Governo ou das Camaras, ou alguma auctoridade publica, ou que tiver procurado influir do voto dos eleitores ou determina-l'os a abster-se de votar, ser? punido com a multa de 500 a 3:000 francos e pris?o d'um mez a um anno, ou d'uma s? d'essas duas penas.
Se algum discurso proferido ou escripto affixado, lido ou distribuido publicamente, nos logares onde se exercer um culto, contiver qualquer provoca??o directa a resistir ? execu??o das leis ou aos actos legaes da auctoridade publica, ou tender a sublevar ou a armar pessoas umas contra as outras, o ministro do culto que d'isso se tiver tornado culpado, ser? punido com pris?o de tres mezes a dois annos, isto sem prejuizo das penas de cumplicidade, do caso em que a provoca??o haja sido seguida de sedi??o, revolta ou guerra civil.
A separa??o da Egreja do Estado, longe de ser uma medida perturbadora, ? antes, ao contrario, uma salvaguarda dos interesses publicos e uma garantia de ordem e de harmonia social.
O que ? o papa e qual a sua situa??o perante os Estados?
<
Sabe-se que, apezar de todos os esfor?os, o papa n?o poude conseguir que o seu representante na Haya, fosse admittido na conferencia da Paz, que abriu verdadeiramente a era do direito cosmopolita moderno e da legisla??o internacional. O papa n?o logrou fazer-se reconhecer na cathegoria das pessoas moraes soberanas, em pleno exercicio, que formam as sociedades juridicas dos povos civilisados egualmente autonomos.
Esta decis?o das potencias, t?o claramente opposta ?s tradi??es pontificias dos seculos passados, foi rigorosa, sob o ponto de vista juridico, por isso que nenhum chefe de religi?o, apenas como chefe de religi?o, era chamado, ou podia mesmo sel-o, a figurar n'esta sociedade dos povos civilisados.
O corpo diplomatico, constituido pelo conjuncto dos diversos governos junto do Vaticano, ? absolutamente distincto do verdadeiro corpo diplomatico que reside em Roma e que ? o unico acreditado junto do soberano italiano em conformidade com as conven??es e os costumes internacionaes.
Os embaixadores da Austria, da Hespanha, de Portugal, os ministros plenipotenciarios da Baviera, da Belgica, da Bolivia, do Brazil, do Equador, da Costa Rica, do Chili, de Guatemala, de Monaco, de Nicaragua, do Per?, da Republica Argentina, do S. Salvador, o encarregado dos negocios da Prussia, gosam de immunidades diplomaticas em Roma, mas apenas em virtude da lei italiana. Estas lega??es, podem pois, desapparecer, por uma simples decis?o unilateral dos poderes que representam, sem que se produza a tal respeito uma viola??o de qualquer pacto internacional.
? a antiga doutrina de Democrito, de Leucippe, de Epicuro e de Lucrecio, fortificada e enriquecida pelas descobertas da sciencia moderna.
Por um lado, devemos fundar exclusivamente sobre os dados da sciencia, a ideia geral que fazemos do mundo, e, por outro lado, devemos estabelecer a nossa moral, exclusivamente sobre o conhecimento scientifico do mundo e da vida. ? um dever stricto afastar todos os dogmas que repousam, as mais das vezes, sobre o embuste intencional.
O mundo ? o mesmo em todas as suas partes e por toda a parte. ? um, com as mesmas leis, leis immutaveis que regem todos os astros e todos os systemas solares. A materia ? uma. Materia, for?a e vida s?o identicas. Os corpos vivos est?o submettidos exactamente ?s mesmas leis que os corpos inorganicos. A sciencia da vida ou biologia ? uma parte da chimica.
Todos os seres vivos de hoje, s?o os descendentes modificados de uma longa serie de animaes desapparecidos ha muito tempo. Esta serie desenvolveu se no nosso planeta durante muitos milh?es de annos. O homem ? o ultimo termo d'essa s?rie, longinqua e immensa, dos seres vivos. Os phenomenos da vida s?o todos perfeitamente reductiveis aos da phisica e da chimica, n?o sendo a vida, a energia e a materia sen?o uma unica e a mesma realidade.
O homem faz pois, parte da natureza e est? sujeito ?s suas leis immutaveis. N?o teve creador. A especie mais similhante ao homem ? a dos macacos. O homem ? um macaco sensivelmente aperfei?oado; o macaco ? um homem sensivelmente inferior. O pensamento ? um facto natural, uma func??o do cerebro, que cessa, assim como a consciencia, quando o cerebro deixa de funccionar. Quando o cerebro morre, morre tambem o pensamento. A pretendida immortalidade da alma ? uma illus?o. A ideia d'um Deus pessoal de que vivem as religi?es, deve ser relegada ao dominio da poesia mystica. A Sciencia regeita-a terminantemente.
Dos differentes principios, scientificamente estabelecidos, Haeckel tira um certo numero de conclus?es de ordem pratica, relativas ? Educa??o, ? Moral e ? Politica. Essas conclus?es s?o vigorosamente hostis ? religi?o e ao clericalismo.
Do que fica exposto d'uma maneira muito generica, facilmente se deduz que o systema philosophico do livre-pensamento, apresentado por Haeckel, foi um verdadeiro acontecimento scientifico que s? por si bastaria para engrandecer o congresso de Roma, aos olhos de todos os pensadores e democratas. Haeckel, tomando parte n'aquella magna assembleia, provou que, al?m d'um sabio de gabinete, era tambem notavel vulgarisador e educador. E, por isso, a sua presen?a no congresso, representou um alto servi?o prestado ao livre-pensamento, o qual, como t?o bem o disse Hector Denis, entrou definitivamente no dominio da ac??o e da vida, proclamando a sua maioridade e a sua capacidade organisadora e creadora. De hoje, em deante j? ninguem o poder? accusar de ser apenas um elemento de revolta e de nega??o. Confunde-se com a sciencia positiva, e ser?, como ella, <
Foi-me pessoalmente muito agradavel o ter feito parte da meza presidida pelo afamado juiz Magnaud, e o ter pertencido ? commiss?o dirigida por Ferdinand Buisson.
Magnaud, segundo uma notavel biographia publicada pelo sr. Diaz Enriquez, ? o presidente do modesto tribunal francez de Chateau-Thierry. Os seus compatriotas chamam lhe <
No que se refere ?s senten?as, Magnaud procede conforme a maxima de que o cumprimento da lei ?, al?m de castigo, ensinamento.
Esta doutrina humanitaria, christ?, n?o ? uma novidade, certamente, mas ? original que um magistrado a applique com o valor, com a tenacidade e a inteireza com que o faz Magnaud.
N'uma sociedade organisada em favor das classes elevadas, na qual s? o facto de ser desgra?ado, colloca o individuo em estado de suspeitoso; sociedade sem amor, sem caridade, sem ideaes, que contempla impassivel as crean?as famintas, andrajosas, tiritando de frio, enroscadas sob os humbraes das portas nas noites geladas do inverno; que consente a prostitui??o de tenras creaturas, acolhidas ao lupanar para aplacar sua estimulante miseria;--n'uma sociedade d'esta natureza, necessita-se ter um profundo sentimento da justi?a, uma consciencia severa do dever, uma ideia alta do papel de magistrado, para p?r-se em pugna com todos os elementos dirigentes com seus proprios collegas em primeiro logar, que se creem censurados por uma justi?a administrativa sem ulteriores intuitos de merc?... Magnaud n?o ? um illuso nem um v?o sentimental, mas um homem de intelligencia clara, de vasta cultura, conhecedor da sociedade em que vive e dos perigos a que se exp?e.
Add to tbrJar First Page Next Page Prev Page