Read Ebook: A Scena do Odio by Almada Negreiros Jos De
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Ebook has 31 lines and 4797 words, and 1 pages
Separata d'A CONTEMPORANEA 7
+A SCENA DO ODIO+
POR
+Jos? d'Almada-Negreiros+
POETA SENSACIONISTA E NARCISO DO EGYPTO
A ALVARO DE CAMPOS
Satanizo-Me Tara na Vara de Moys?s! O castigo das serpentes ?-Me riso nos dentes, Inferno a arder o Meu cantar! Sou Vermelho-Niag?ra dos sexos escancarados nos chicotes dos cossacos! Sou Pan-Demonio-Trifauce enfermi?o de Gula! Sou Genio de Zarathustra em Ta?as de Mar?-Alta! Sou Raiva de Medusa e Damna??o do Sol!
Ladram-Me a Vida por viv?-La e s? me deram Uma! H?o-de lati-La por sina! agora quero viv?-La! Hei-de Poeta cant?-La em Gala sonora e dina! Hei-de Gloria desannuvi?-La! Hei-de Guindaste i??-La Esfinge da Valla commum onde Me querem rir! Hei-de trov?o-clarim lev?-La Luz ?s Almas-Noites do Jardim das Lagrymas! Hei-de bombo ruf?-La pompa de Pompeia nos Funeraes de Mim! Hei-de Alfange-Mahoma cantar Sodoma na Voz de Nero! Hei-de ser Fuas sem Virgem do Milagre, hei-de ser galope opiado e doido, opiado e doido..., hei-de ser Attila, hei-de Nero, hei-de Eu, cantar Attila, cantar Nero, cantar Eu!
Sou throno de Abandono, mal-fadado, nas iras dos barbaros, meus Av?s. Oi?o ainda da Berlinda d'Eu ser sina gemidos vencidos de fracos, ruidos famintos de saque, ais distantes de Maldi??o eterna em Voz antiga! Sou ruinas razas, innocentes como as azas de rapinas afogadas. Sou reliquias de martyres impotentes sequestradas em antros do Vicio e da Virtude. Sou clausura de Sancta professa, M?e exilada do Mal, Hostia d'Angustia no Claustro, freira demente e donzella, virtude sosinha da cella em penitencia do sexo! Sou rasto espesinhado d'Invasores que cruzaram o meu sangue, desvirgando-o. Sou a Raiva atavica dos Tavoras, o sangue bastardo de Nero, o odio do ultimo instante do condemnado innocente! A podenga do Limbo mordeu raivosa as pernas nuas da minh'Alma sem baptismo... Ah! que eu sinto, claramente, que nasci de uma praga de ciumes! Eu sou as sete pragas sobre o Nylo e a Alma dos Borgias a penar!
E eu vivo aqui desterrado e Job da Vida-gemea d'Eu ser feliz! E eu vivo aqui sepultado vivo na Verdade de nunca ser Eu! Sou apenas o Mendigo de Mim-Proprio, orph?o da Virgem do meu sentir.
Ah! que eu sinto, claramente, que nasci de uma praga de ciumes! Eu sou as sete pragas sobre o Nylo e a Alma dos Borgias a penar!
Hei-de, entretanto, gastar a garganta a insultar-te, ? b?sta! Hei-de morder-te a ponta do rabo e p?r-te as m?os no ch?o, no seu logar! Ahi! Salt?mbanco-bando de bandoleiros nefastos! Quadrilheiros contrabandistas da Imbecilidade! Ahi! Espelho-aleij?o do Sentimento, macaco-intruja do Alma-realejo! Ahi! maquerelle da Ignorancia! Silenceur do Genio-Tempestade! Spleen da Indigest?o! Ahi! meia-tijella, trav?o das Ascens?es! Ahi! povo judeu dos Christos mais que Christo! ? burguezia! ? ideal com i pequeno! ? ideal roc?c? dos Mendes e Possidonios! ? cofre d'indigentes cuja personalidade ? a moral de todos! ? geral da mediocridade! ? claque ignobil do vulgar, protagonista do normal! ? catitismo das lindezas d'estalo! Ahi! lucro do facil, cartilha-cabotina dos limitados, dos restringidos! Ahi! dique impecilho do Canal da Luz! ? coito d'impotentes a corar ao sol no riacho da Estupidez! Ahi! Zero-barometro da Convic??o! bitola dos chega, dos basta, dos n?o quero mais! Ahi! plebeismo aristocratisado no pre?o do panam?! erudi??o de cal?a de xadrez! competencia de relogio d'oiro e corrente com suores do Brazil e berloques de cornos de buffalo!
Zutt! bruto-parvo-nada que Me roubaste tudo: 't? Me roubaste a Vida e n?o Me deixaste nada! nem Me deixaste a Morte! Zutt! poeira-pingo-microbio que gemes pequenissimo gemidos gigantes, gravido de uma d?r profeta colossal! Zutt! elefante-berloque parasita do n?o presta! Zutt! bugiganga-celluloide-bagatella! Zutt! b?sta! Zutt! b?coro!! Zutt! merda!!!
E tu, tambem, vieille-roche, castello medieval fechado por dentro das tuas ruinas! Fiel epitaphio das cronicas aduladoras! E tu tambem, ? sangue azul antigo que j? nasceste co'a biographia feita! ? pagem loiro das cortezias-avozinhas! ? pergaminho amarello-mumia das grandes galas brancas das paradas e das victorias dos torneios-loterias com donzellas-glorias! ? resto de sceptros, fumo de cinzas! ? lavas frias do vulc?o pyrotechnico com chuvas d'oiros e cabeleiras prateadas! ? estilha?os heraldicos de vitraes despegados lentamente sobre o tanque do silencio! ? cedro secular debru?ado no muro da Quinta sobre a estrada a estorvar o caminho da Mala-posta!
E v?s tambem, ? Gentes de Pensamento, ? Personalidades, ? Homens! Artistas de todas as partes, crist?os sem patria, Christos vencidos por serem s? Um! E v?s, ? Genios da Express?o, e v?s tambem, ? Genios sem Voz! ? alem-infinito sem regressos, sem nostalgias, Espectadores gratuitos do Drama-Imenso de V?s-Mesmos! Prophetas cladestinos do Naufragio de Vossos Destinos!
E vos tambem, theoricos-irm?os-gemeos do meu sentir internacional! ? escravos da Independencia!
E tu tambem, Belleza Canalha co'a sensibilidade manchada de vinho! O lyrio bravo da Floresta-Ardida ? meia-porta da tua Miseria! ? Fado da M?-Sina com illustra??es a giz e lettra da Maldi??o! ? f?ra vadia das viellas a?aimada na Lei! O chale e len?o a resguardar a tysica! ? franzinas do fanico co'a syphilis ao collo por essas esquinas! ? nu d'aluguer na meia-luz dos cortinados corridos! ? oratorio da meretriz a mendigar gorgetas pr'? sua Senhora da Boa-Sorte! ? gentes tatuadas do cal?o! ? carro vendado da Penitenciaria!
E tu tambem, ? Humilde, ? S?mples! enjaulados na vossa Ignorancia! ? p? descal?o a callejar o cerebro! ? musculos da saude de ter fechada a casa de pensar! ? alguidar de ass?rda fria na ceia-fadiga da d?r-candeia! ? esteiras duras pr'a dormir e fazer filhos! ? carretas da Voz do Operario com gente de preto a p? e philarmonica atraz! ? campas razas engrinaldadas, com chap?es de ferro e bal?es de vidro! ? bota r?ta de mendingo abandonada no p? do caminho! ? metamorphose-selvagem das feras da cidade! ? gera??o de bons ladr?es crucificados na Estupidez!
? sanfona-saloia do fandango dos campinos! ? pampilho das Lezirias innundadas de Cidade!
E v?s varinas que sabeis a sal e que trazeis o Mar no vosso avental!
E v?s tambem, ? mo?as da Provincia que trazeis o verde dos campos no vermelho das faces pintadas.
E tu tambem ? mau gosto co'a saia de baixo a v?r-se e a falta d'educa??o! ? oiro de pechisbegue a luzir no vermelho verdadeiro da blusa de chita! ? tedio do domingo com botas novas e musica n'Avenida! ? sancta Virgindade a garantir a falta de lindeza! ? bilhete postal illustrado com appari??es de beijos ao lado!
? Arsenal-fadista de ganga azul e c?co socialista! ? sahidas p?r-do-sol das Fabricas d'Agonia!
E v?s tambem, nojentos da Politica que exploraes eleitos o Patriotismo! Maquereaux da Patria que vos pariu...
E v?s tambem, pindericos jornalistas que fazeis cocegas e outras coisas ? opini?o publica!
E tu tambem, roberto fardado: Futrica-te espantalho engalonado, apeia-te das patas de barro, larga a espada de matar e p?e o penacho no rabo! R?lha-te mercenario, asceta da Crueldade! Espuma-te no chumbo da tua Valentia! Agoniza-te Rilhafolles armado! Desuniversidadiza-te da doutoran?a da chacina, da sciencia da matan?a! Groom fardado da N?gra, p?ria da Velha! Encaveira-te nas esp?ras luzidias de s?res fera! Despe-te da farda, desenfia-te da Impostura, e p?e te nu, ao l?u que ficas desempregado! Acoura?a-te de Senso, vomita de vez o morticinio, enche o pote de raciocinio, aprende a l?r cora??es, que ha muito mais que fazer do que fazer revolu??es! Rebusca no s?res selvagem, no teu cofre do exterminio o teu calibre maximo! acaba de vez com este planeta, faze-te Deus do Mundo em dar-lhe fim!
Olha os que n?o s?o nada por te cantarem a ti! tantos mundos! tantos genios que n?o fizeram nada, que deixaram este mundo tal qual! Olha os grandes o que s?o, estragados por ti! E de que serve o livro e a sciencia se a experiencia da vida ? que faz comprehender a sciencia e o livro? Antes n?o ter sciencias! Antes n?o ter livros!
Larga a cidade masturbadora, febril, rabo decepado de lagartixa, labyrintho cego de toupeiras, ra?a de ignobeis myopes, tysicos, tarados, anemicos, cancerosos e arseniados! Larga a cidade! Larga a infamia das ruas e dos boulevards, esse vae-vem cynico de bandidos mudos, esse mexer esponjoso de carne viva, esse s?r-l?sma nojento e macabro, essess zig-zag de chicote auto-fustigante, esse ar expirado e espiritista, esse Inferno de Dante por cantar, esse ruido de sol prostituido, impotente e velho, esse silencio pneumonico de lua enxovalhada sem vir a lavadeira!
Larga a cidade e foge! Larga a cidade! Mas larga tudo primeiro, ouviste? Larga tudo! --Os outros, os sentimentos, os instinctos, e larga-te a ti tambem, a ti principalmente! Larga tudo e vae para o campo e larga o campo tambem! --P?e-te a nascer outra vez! N?o queiras ter pae nem m?e, n?o queiras ter outros, nem Intelligencia! E j? houve Intelligencia a mais: pode parar por aqui! Depois p?e-te a viver sem cabe?a, v? s? o que os olhos virem, cheira os cheiros da Terra, come o que a Terra d?r, bebe dos rios e dos mares, --p?e-te na Natureza!
Mas tu nem vives, nem deixas viver os mais, Cr?pula do Egoismo, cartola d'espanta-pardaes! Mas has-de pagar-Me a febre-rodopio nov?llo emmaranhado da minha d?r! Mas has-de pagar-Me a febre-calafrio abysmo descida de Eu n?o querer descer! Has-de pagar-Me o Absyntho e a Morfina! Hei-de ser cigana da tua sina! Hei-de ser a bruxa do teu remorso! Hei-de desforra-d?r cantar-te a buena-dicha em aguas-fortes de Goya e no cavallo de Troya e nos poemas de Po?! Hei-de feiticeira a gallope na vassoira largar-te os meus lagartos e a Pe??nha! Hei-de vara magica encantar-te arte de ganir! Hei-de reconstruir em ti a escravatura n?gra! Hei-de despir-te a pelle a pouco e pouco e depois na carne viva deitar fel, e depois na carne viva semear vidros, semear g?mes, l?mes, e tiros! Hei-de gosar em ti as p?ses diabolicas dos theatraes venenos tragicos da persa Zoroastro! Hei-de rasgar-te as vrilhas com forquilhas e croques, e desfraldar-te nas canellas mirradas o n?gro pend?o dos piratas! Hei-de corvo marinho beber-te os olhos v?sgos! Hei-de boia do Destino ser em braza e tu naufrago das gal?s sem horizontes verdes!
Ah que eu sinto claramente que nasci de uma praga de ciumes! Eu sou as sete pragas sobre o Nylo e a alma dos Borgias a penar!
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