Read Ebook: Camões e o amor no aniversario 304 da morte do poeta by Pires Ernesto
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Ebook has 141 lines and 5489 words, and 3 pages
Quando poisar d'ausencia o escuro manto E se ouvir, n'uns timidos harpejos, O meu remoto e solitario canto,
? brisas que passaes por estes brejos, Estou a ungil-a com saudoso pranto E a reanimal-a com ardentes beijos.
AI, VEM!
N?o sei se sabes quanto amor eu tenho, Guardado dentro d'alma, com fervor, Como um crente que estreita um Santo Lenho, Juncto do cora??o, cheio d'ardor.
Em bem guardal-o ponho grande empenho, Intacto como o Lenho do Senhor; Hasde sentil-o que tambem convenho Que arde em teu peito um semelhante amor.
Escuta, ao longe, escuta essa harmonia, Cantam os rouxinoes, nos arvoredos, Banhados pela lua que irradia.
Confiam, mutuamente, os seus segredos... --Ai, vem tambem contar-me a melodia Dos teus sonhos d'amor, d'amor t?o ledos.
DUVIDA
Tu tens no cora??o todo o perfume Que me embriaga a alma, docemente, Que m'a eleva voando, mansamente, Por ceu azul sem mancha, nem negrume.
Tu ?s, senhora, o alevantado cume Da montanha do amor, onde vou, crente, Curvar-me de joelhos, reverente, Pelo poder que o teu olhar assume.
E sempre a adorar-te ficaria Se soubesse que dentro do teu seio Um affecto por mim rebentaria.
Assim, vivendo num cruel receio, Topando a noite aonde espero o dia, Talvez n?o ache da ventura um veio.
FELIZ SAUDADE
Heide lembrar-me sempre, com saudade, D'aquella noite gelida de inverno, Em que poisaste, amor, o labio terno Sobre o meu labio frio. Na anciedade
De enclausurar do amor a immensidade Dentro do peito meu, o amor eterno, Que ora nos salva e outr'ora d? o inferno Aos sonhos bons da franca mocidade,
Sonhei coisas divinas, myst'riosas... No aroma sideral do beijo ardente Sorvi o alento das sensiveis rosas.
Depois ouvi, ao longe, meigamente, ? tua voz, n'umas can??es saudosas: --Eu heide amar-te muito e eternamente.
IMMENSA DOR
Do teu olhar a doce claridade Deu novo rumo ? minha triste vida, Abriu-me a alma ? luz da immensidade, Tornou-me a esp'ran?a ha muito foragida.
E hade talvez, atroz preversidade! Lan?ar de novo a alma redemida Entre os fataes escombros da saudade Essa que foi por mim compadecida?
Mostrar o sol a quem vive na treva E lan?al-o, depois, ? noite escura, Fugir de Ad?o a delicada Eva...
Senhora minha, se ? assim t?o dura A consciencia que d'amor me enleva, Ser? eterna a minha desventura.
ULTIMA SUPPLICA
Eu tenho os olhos gastos por chorar-te, Por tua ausencia eu trago o peito anceado, Procuro-te no espa?o illimitado, No mar, na terra, emfim em toda a parte.
Embora a mente julgue divisar-te No seio d'uma estrella, illuminado Ou d'uma fl?r no calix perfumado, Nem sei aonde v? para adorar-te.
Tudo me falla em ti!... Ninguem me escuta Se busco em ti fallar, vis?o perdida! De d?r assim o cora??o se enlucta.
Immaculado amor, pomba fugida, Da sombra aonde est?s termina a lucta A quem por te n?o ver morre na vida.
CIUME
N?o sabe com certesa o que ? ciume, O que ? sentir no peito, em vida, gelo, Pegar no cora??o e contorcel-o, Subir da raiva e do odio ao negro cume.
N?o sabe o que ? do amor o ardente lume... Sonhar um vasto ceu e comprehendel-o, Para ver, cruelmente, desfasel-o, Na sombra da illus?o, voraz negrume.
N?o sabe, n?o, senhora!... ai! se o soubesse, Se o podesse antever, se o comprehendesse, Estrangulando a vida, ? voz do amor...
Por mais cruel que fosse n?o daria A uma alma, irm? da sua, essa agonia Vendo-a morrer em convuls?es de dor.
ETERNO AMOR
Se a morte me extinguir a mocidade, Cortando o fio de penosa vida, Julgar-me-has uma illus?o perdida, Haver? dentro em ti uma saudade?
Buscar?s descobrir, na immensidade, Quando a noite passar enegrecida, Uma estrella serena e dolorida Que te falle de mim, da eternidade?
Ou antes, esquecendo antigo enleio, Extinguir?s de vez, dentro em teu seio A lava enorme d'um passado amor?
Se f?r assim, em noite tenebrosa, Tu hasde ouvir minh'alma lacrimosa, Magoadamente a suspirar de dor.
SUPPLICIO AMADO
Com oiro fino e pedras recamado, Outr'ora um rei de Hungria deu o throno, Para dormir um passageiro somno D'uma donsella no rega?o amado.
Ao ver o rei assim apaixonado Sorria a corte com sinistro entono! Neto de heroes vencido... ao abandono... --Ai, quem em tal houvera ent?o pensado.
Se f?ra rei daria o throno, a gloria, A c'roa, o manto, a fama, a patria, a historia, O pa?o, as cortes?s e o sceptro bello,
N?o por dormir um somno d'innocencia No teu rega?o, em morbida indolencia, Mas para me enforcar no teu cabello.
SE ESCUTO...
Se escuto ao longe a timida harmonia Da tua voz vibrante, modulando Um cantico d'amor, ou suspirando Em requebros profundos d'agonia;
Bebe minh'alma, ent?o, a melodia Que o labio teu, assim, vem distillando E sabe Deus se, ali, sempre ficando Minh'alma de beber se fartaria.
A tua voz serena ? mais suave Que o colo branco e puro d'uma ave Que o seio mais gentil d'uma rainha.
Ai, viesses tu cantar, eternamente, Sorrindo ou solu?ando, docemente Dentro do peito meu, ? alma minha!
DEPOIS DA MORTE
Se a crua morte te arrancar um dia Dos bra?os meus, ? pomba estremecida! Ir? no teu caix?o a minha vida, Do meu amor a doce melodia.
Quando sentires collada a terra fria Sobre o gelado peito e comprimida A nivea face que a beijar convida E que continuamente beijaria;
Hasde ouvir minh'alma, suspirando, Muito de manso, como um tenue alento, No canto triste do nocturno bando.
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