Read Ebook: O Infante D. Henrique e a arte de navegar dos portuguezes by E A Vicente De Almeida De
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E assim se percorreu o Atlantico e se chegou ao Oriente!
Foi com Pedro Nunes que a arte de navegar assumiu entre n?s uma fei??o verdadeiramente nacional. At? ent?o os fundamentos scientificos das praticas dos nossos mareantes podem dizer-se derivados de fontes estrangeiras, se bem que j? muito aperfei?oados por Portuguezes, sobretudo no que dizia respeito ? observa??o dos phenomenos physicos do Oceano, como manifestamente devia acontecer, visto que eram Portuguezes quem mais longe n'elle navegavam. Mas com Pedro Nunes ha positiva originalidade, e por isso o seu nome ? por tal f?rma notavel e preeminente na nossa historia scientifica, que bem merece que n'elle nos detenhamos um momento.
Pedro Nunes foi principalmente um theorico, pois n?o consta que tivesse navegado. Como, por?m, era um espirito esclarecido, de uma esphera muito elevada, as suas elucubra??es nos diversos pontos da arte de navegar produziram resultados valiosos, que depois poderam ser applicados por homens praticos como D. Jo?o de Castro. D'esses estudos, os que mais principalmente chamaram a sua atten??o, foram o aperfei?oamento dos methodos para obter a latitude e a mais exacta determina??o da varia??o da agulha, n?o devendo tambem deixar-se de mencionar a sua theoria da navega??o pelo circulo maximo, que elle estabeleceu completa e perfeita.
Quanto ?s agulhas de marear alguma coisa mais julgo dever dizer.
Tem-se escripto e repetido que foi Christovam Colombo quem primeiro descobriu o phenomeno da varia??o da agulha. Assim ser?, posto que no meu espirito haja a tal respeito muita duvida. Que, se o facto fosse verdadeiro, em nada diminuia a importancia das descobertas nauticas dos Portuguezes, porque, senhores, a verdade ? esta: Colombo foi um navegador da escola nautica de Portugal; nem mais... nem menos.
Ora bem depressa foi reconhecido n?o s? que a varia??o mudava com o decorrer do tempo, mas ainda que ella variava para os differentes logares da terra, e por isso Pedro Nunes, reprovando o uso das agulhas que chamaremos compensadas, inventou novos methodos para determinar a varia??o, os quaes D. Jo?o de Castro foi encarregado de experimentar nas suas viagens. Foi d'essas experiencias, feitas por um homem altamente apto para as realisar, que resultaram grandes progressos no conhecimento das leis do magnetismo, e entre elles a descoberta do phenomeno do desvio local, ?cerca do qual n?o posso furtar-me ao prazer de citar o respectivo trecho do Castro. <
O phenomeno da varia??o da agulha deu muito que pensar aos nossos mareantes, e originou uma id?a, que por muito tempo occupou o espirito tanto dos theoricos como dos praticos.
Por isso os navegadores serviam-se pela maior parte de indica??es tiradas da pratica, e entre estas, quando se achavam proximos de terra da observa??o das diversas especies de sargassos e algas, peixes, e sobretudo de aves, que lhes appareciam, taes como entenaes, feij?es, mangas de veludo, gaivot?es, borrelhos, calcamares, rabi-forcados, garajaos e garajinhas, e outros de que, nos falla o bom Pimentel, n?o esquecendo os cagalhos que pela singularidade do nome n?o percam. J? se v? que os nossos mareantes precisavam de ter um curso completo de ornithologia.
A theoria era errada, como hoje sabemos, pois as linhas isogonicas nem coincidem com os meridianos terrestres, nem s?o constantes no tempo. Mas o pensar-se n'ella mostra cabalmente que os Portuguezes procuravam resolver os problemas do mar do melhor modo possivel.
E comtudo, convem dizer, parece que Pedro Nunes n?o dava muito credito ? hypothese, o que mais uma vez prova a superioridade d'aquelle grande espirito.
N?s que sabemos a quasi supersti??o com que os marinheiros ainda hoje contemplam a agulha, o respeito com que a tratam, a afflic??o que por vezes se apossa d'elles quando a v?em endoidecer em occasi?o de grandes balan?os, bem podemos imaginar o que seria n'essas epochas de rudes conhecimentos, em que da agulha tudo se esperava, e dos seus desvarios tudo se temia. E, lan?ando um ultimo olhar de respeito a esses esfor?os da intelligencia nautica dos nossos antecessores, n?s para quem hoje a navega??o parece um brinco, tantas s?o as facilidades dos processos modernos, t?o exactas as approxima??es a que podemos chegar nos calculos, lembremo-nos de que ainda ao presente a determina??o da varia??o e sobretudo do desvio ?, porventura, o maior cuidado do navegador.
Mas baste o que j? tenho dito. O tempo corre, e, tendo fallado tanto da arte de navegar, ? bem que diga alguma cousa a respeito dos que a praticaram.
Mais, tarde, por?m, e sobretudo a datar da viagem de Bartholomeu Dias, come?a a historia a individualisar os nomes dos pilotos que d'aquelle segundo servi?o eram especialmente encarregados nas expedi??es maritimas. Depois, quando a carreira da India passou a ser annualmente frequentada pelas armadas, quando, attingido o objectivo no Oriente e no Atlantico, se tratou mais da conquista que do descobrimento, os capit?es das naus e os capit?es-m?res das armadas eram por via de regra tirados de entre os filhos da nobreza, a quem se queria adiantar em fortuna, posto que quasi sempre depois de j? terem dado provas de valor militar e saber politico, ou nos servi?os da metropole ou na defeza das pra?as de Africa. Succedia ent?o que aquelles chefes, por vezes, ignoravam os rudimentos da manobra e da arte de navegar, e por isso estes servi?os, at? certo ponto reputados inferiores em compara??o com o nobre exercicio das armas, eram das attribui??es exclusivas dos mestres e pilotos.
Mas apesar de tudo, apesar dos erros e teimosias de alguns pilotos terem sido a causa provada do lastimosos naufragios, n?o devemos esquecer quantos servi?os se devem a esses homens que em t?o dilatadas navega??es n?o tinham para determinar o ponto os elementos de que hoje se disp?e. Registemos, pois, os nomes de Pedro d'Alemquer, Alvaro Martins e Jo?o do Santiago, pilotos da expedi??o de Bartholomeu Dias; os de Jo?o de Coimbra e Pedro de Escobar, que com o mesmo Pedro d'Alemquer foram com Vasco da Gama ? India na primeira viagem, e que ali?s n?o mostraram muita coragem, se ? verdadeira a narrativa de Gaspar Corr?a; o de Pedro Vaz de Caminha que foi na viagem de Cabral; e sobretudo o do famoso Vicente Rodrigues, piloto-m?r da India, que fez um Roteiro e se applicou muito ao problema da varia??o da agulha, e ainda o de Gaspar Reim?o, que tambem fez um Roteiro.
Nem sempre, por?m, os commandantes estavam n'aquellas circumstancias que acima indiquei. Frequentes vezes individuos que a bordo desempenhavam cargos mais elevados que o de mestre ou piloto, tinham conhecimentos completos de marinharia. Ent?o, se uma nau ou uma armada acertava de ter por commandante um d'esses homens, o papel do piloto tornava-se secundario, e era o capit?o que fazia a navega??o. Homens taes, reunindo ao poder militar e politico, exercido com saber superior, o conhecimento da manobra e da nautica, eram verdadeiramente o que hoje se entende pela denomina??o de--officiaes de marinha--. Assim o foram Vasco da Gama, Duarte Pacheco, Fern?o de Magalh?es, D. Jo?o de Castro, Martim Affonso de Sousa, Antonio Galv?o, Diogo Botelho Pereira, Diogo do S?, D. Manuel de Menezes e tantos outros.
O que fosse a aula do cosmographo-m?r nos ultimos tempos p?de avaliar-se por esta cita??o de Stockler: <
E se Portugal se n?o lan?asse no caminho do desconhecido e n?o conquistasse assim para si gloria e poder t?o grandes que lhe deram jus a uma vida independente, n?o estaria elle j? de ha muito absorvido na unidade peninsular, tantas vezes tentada e sempre repellida?
Gloria, pois, ao inclito D. Henrique, ao prestigioso Infante, que abriu aos nossos antecessores o caminho dos mares, e nos permittiu a n?s, Portuguezes e marinheiros de hoje, vivermos livres ? sombra da bandeira das quinas, symbolo amado da nossa t?o querida patria.
BIBLIOGRAPHIA
LISTA DOS PRINCIPAES TRABALHOS IMPRESSOS, RELATIVOS ? <
TRATADISTAS
A 1.^a edi??o mencionada, de Coimbra, ? apontada por Barbosa, Ribeiro dos Santos, Innocencio e outros; n?o consegui, por?m, ver um exemplar d'ella, ao passo que s?o frequentes os da 2.^a edi??o, 1573, em cujo prologo o editor censura os erros das anteriores edi??es d'esta obra de Pedro Nunes, sem comtudo as designar explicitamente. Parece, pois, que aquelles bibliographos fizeram alguma confus?o.
ALMANACHS, REPORTORIOS, ETC.
ROTEIROS
TRABALHOS HISTORICOS E CRITICOS
Notas:
Em trabalhos, publicados j? depois da celebra??o do Centenario, volta-se a p?r em duvida a diuturnidade da permanencia do Infante em Sagres. Parece-me que ainda haver? muito que investigar a este respeito; creio, comtudo, poder-se affirmar que foi do Algarve, e principalmente dos seus portos occidentaes, que derivou a grande corrente dos descobrimentos nos primeiros tempos.
Era um astrolabio feito por Nicolau Patenal em 1616; pertence ? collec??o de instrumentos nauticos da Escola Naval.
Em seguida copiamos o titulo completo e o fecho da obra fundamental do doutor Pedro Nunes sobre navega??o, bem como o Regimento da altura.
< Item dous tratados que o mesmo Doutor fez sobre a carta de marear. En os quaes se decrar?o todas as principaes duvidas da navega??o. Com as tavoas do mouimento do sol e sua declina??o. E o Regimento da altura assi ao meyo dia como nos outros tempos. Com previlegio real.>> < < < Se o sol tem declina??o pera o norte e as sombras v?o pera o norte; saberemos pello estrelabio ao meo dia que he na mayor altura quantos graos ha de n?s ao sol: e acrecentaremos a declina??o d'aquelle dia: e o que somar ser? o que estamos apartados da linha equinocial para o norte. < Mas se o sol tem declina??o pera o norte e as sombras v?o pera o sul: saberemos pello estrelabio quanto ha de n?s ao sol: e pelo regimento a declina??o: e se forem iguais estaremos na equinocial. E se forem desiguais: tiraremos o menor numero do mayor, porque o que ficar, isso estaremos apartados da equinocial: e ser? pera o norte se a declina??o era mayor: e ser? pera o sul se a declina??o era menor. < A mesma regra nos serve tendo ho sol declina??o pera o sul, porque se as sombras v?o para o sul ajuntaremos o que ha de n?s ao sol com a declina??o: e o que somar isso estaremos apartado da equinocial pera o sul. < Mas se o sol tem declina??o pera o sul e as sombras v?o ao norte: se o que ha de n?s ao sol for igual ? declina??o, estaremos na equinocial. E se forem desiguais tiraremos o menor numero do mayor: e o que ficar ser? o que ao tal tempo estaremos apartados da equinocial: e ser? pera o sul se a declina??o for mayor e ser? pera o norte se a declina??o for menor. < E quando n?o houver declina??o: ho que ouver de n?s ao sol, isso estaremos apartados da equinocial; e ser? pera onde forem as sombras. < E em todo tempo que o sol pello estrelabio estiver em noventa graos: o que elle tiver de declina??o, isso mesmo estaremos apartados da equinocial e pera a mesma parte.>> Quando escolhi para assumpto d'esta conferencia <>, n?o foi minha inten??o embrenhar-me em explana??es scientificas ou controversias criticas, mas apenas fazer uma rapida exposi??o historica; nem outra cousa consentiam tanto a indole de taes palestras como a orienta??o dos meus estudos habituaes. ? extraordinario isto! Ora, sem entrar em polemica, direi apenas, ampliando as palavras que proferi na conferencia: V?-se que o que escrevem o sr. Bertelli e outros, ? resultado de uma errada orienta??o, que mal se justifica pelo patriotismo. A Italia teve excellentes mareantes nos seus Amalfitanos, Pisanos, Genovezes e Venezianos, que verdadeiramente ensinaram as outras na??es em muitas partes da marinharia; a Hespanha n?o os teve menos excellentes nos seus Catal?es e Malhorquinos. Mas nem um nem outro d'esses povos se abalan?aram a devassar os segredos do Atlantico antes dos Portuguezes. Vem depois Colombo que aprendeu em Portugal; e a Italia, envaidecida de lhe ter dado o ber?o, e a Hespanha gloriosa de lhe ter aproveitado os trabalhos, cada qual disputa a quem melhor lho exaltar? os meritos, louvando-o pelo que fez e pelo que n?o fez, e pondo no escuro a obra dos navegadores portuguezes. ? isto que a critica scientifica n?o consente. < < < <
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