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Read Ebook: Os Lusíadas by Cam Es Lu S De

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Ebook has 1122 lines and 57566 words, and 23 pages

OS LVSIADAS de Luis de Ca- mo?s.

COM PRIVILEGIO REAL.

Impressos em Lisboa, com licen?a da sancta Inquisi??o, & do Ordinario: em casa de Antonio G??aluez Impressor. 1572.

? OS LVSIADAS DE LVIS DE CAM?ES.

Canto primeiro.

As armas, & os ba- r?es assinalados, Que da Occidental praya Lusi- tana, Por mares nunca de antes na- uegados, Passaram, ainda alem da Taprobana, Em perigos, & guerras esfor?ados, Mais do que prometia a for?a humana. E entre gente remota edificar?o Nouo Reino, que tanto sublimar?o.

E tambem as memorias gloriosas Daquelles Reis, que for?o dilatando A Fee, o Imperio, & as terras viciosas De Affrica, & de Asia, andar?o deuastando, E aquelles que por obras valerosas Se v?o da ley da Morte libertando. Cantando espalharey por toda parte, Se a tanto me ajudar o engenho & arte.

Cessem do sabio Grego, & do Troyano, As nauega??es grandes que fizer?o: Callese de Alexandro, & de Trajano, A fama das victorias que tiuer?o, Que eu canto o peyto illustre Lusitano, A quem Neptuno, & Marte obede?er?o: Cesse tudo o que a Musa antigua canta, Que outro valor mais alto se aleuanta.

E vos Tagides minhas, pois criado Tendes em my hum nouo engenho ardente. Se sempre em verso humilde, celebrado Foy de my vosso rio alegremente, Daime agora hum som alto, & sublimado, Hum estillo grandiloco, & corrente, Porque de vossas agoas Phebo ordene, Que n?o tenh?o enueja aas de Hypocrene.

Daime h?a furia grande & sonorosa, E n?o de agreste a vena, ou frauta ruda: Mas de tuba canora & belicosa, Que o peito acende, & a cor ao gesto muda: Daime igoal canto aos feitos da famosa Gente vossa, que a Marte tanto ajuda: Que se espalhe & se conte no vniuerso, Se tam sublime pre?o cabe em verso.

E vos ? bem nascida seguran?a Da Lusitana antigua liberdade, E n?o menos certissima esperan?a, De aumento da pequena Christandade: Vos o nouo temor da Maura lan?a, Marauilha fatal da nossa idade: Dada ao mundo por Deos q? todo o mande, Pera do mundo a Deos dar parte grande.

Vos tenrro, & nouo ramo florecente, De h?a aruore de Christo mais amada Que nenh?a nascida no Occidente, Cesarea, ou Christianissima chamada: Vedeo no vosso escudo, que presente Vos amostra a victoria ja passada. Na qual vos deu por armas, & deixou As que elle pera si na Cruz tomou.

Vos poderoso Rei, cujo alto Imperio, O Sol logo em nascendo ve primeiro: Veo tambem no meio do Hemispherio, E quando dece o deixa derradeiro. Vos que esperamos jugo & vituperio, Do torpe Ismaelita caualleiro: Do Turco Oriental, & do Gentio, Que inda bebe o licor do sancto Rio.

Inclinay por hum pouco a magestade, Que nesse tenrro gesto vos contemplo, Que ja se mostra, qual na inteira idade, Quando sobindo yreis ao eterno templo, Os olhos a real benignidade Ponde no ch?o: vereis hum nouo exemplo, De amor, dos patrios feitos valerosos, Em versos deuulgado numerosos.

Vereis amor da patria, n?o mouido De premio vil: mas alto, & quasi eterno Que nam he premio vil, ser conhecido Por hum preg?o do ninho meu paterno. Ouui vereis o nome engrandecido Daquelles de quem sois senhor superno. E julgareis qual he mais excelente, Se ser do mundo Rei, se de tal gente:

Ouui, que n?o vereis com v?s fa?anhas Fantasticas, fingidas, mentirosas, Louuar os vossos, como nas estranhas Musas, de engrandecerse desejosas, As verdadeiras vossas sam tamanhas, Que excedem as sonhadas fabulosas: Que excedem Rodamonte, & o v?o Rugeiro, E Orlando, inda quefora verdadeiro.

Por estes vos darey hum Nuno fero, Que fez ao Rei, & ao Reino tal serui?o, Hum Egas, & h? dom Fuas, q? de Homero A Citara parelles so cobi?o: Pois polos doze pares daruos quero, Os doze de Inglaterra, & o seu Magri?o. Douuos tambem aquelle illustre Gama, Que para si de Eneas toma a fama.

Pois se a troco de Carlos Rei de Fran?a, Ou de Cesar, quereis iqual memoria: Vede o primeiro Afonso, cuja lan?a Escura faz qualquer estranha gloria: E aquelle que a seu Reino a seguran?a Deixou, com a grande & prospera victoria. Outro Ioane, inuicto caualleiro, O quarto, & quinto Afonsos, & o terceiro.

Nem deixar?o meus versos esquecidos, Aquelles que nos Reinos la da Aurora, Se fizer?o por armas tam subidos, Vossa bandeira sempre vencedora. Hum Pacheco fortissimo, & os temidos Almeidas, por quem sempre o Tejo chora. Albuquerque terribil, Castro forte, E outros em quem poder n?o teue a morte.

E em quanto eu estes canto, & a vos nam posso Sublime Rei, que nam me atreuo a tanto, Tomay as redeas vos do Reino vosso, Dareis materia a nunca ouuido canto: Comecem a sentir o peso grosso, De exercitos, & feitos singulares, De affricas as terras, & do Oriente os mares.

Em vos os olhos tem o Mouro frio, Em quem v? seu exicio afigurado, So com vos ver o barbaro Gentio, Mostra o pesco?o ao jugo ja inclinado: Thetis todo o ceruleo senhorio, Tem pera vos por dote aparelhado: Que affei?oada ao gesto bello, & tenro, Deseja de compraruos pera genro.

Em vos se vem da Olimpica morada, Dos ous au?s, as almas ca famosas, H?a na paz Angelica dourada, Outra polas batalhas sanguinosas: Em vos esper?o, verse renouada, Sua memoria, & obras valerosas. E la vos tem lugar no fim da idade, No templo da suprema eternidade.

Mas em quanto este tempo passa lento, De regerdes os pouos, que o desej?o: Day vos fauor ao nouo atreuimento, Pera que estes meus versos vossos sej?o: E vereis ir cortando o salso argento: Os vossos Argonautas, por que vej?o, Que sam vistos de vos no mar yrado, E costumaiuos ja a ser inuocado.

Ia no largo Occeano nauegau?o, As inquietas ondas apartando, Os ventos brandamente respirau?o, Das naos as vellas concauas inchando: Da branca escuma, os mares se mostrau?o Cubertos, onde as proas v?o cortando. As maritimas agoas consagradas, Que do gado de Proteo sam cortadas.

Quando os Deuses no Olimpo luminoso, Onde o gouerno esta, da humana gente, Se ajunt?o em consilio glorioso, Sobre as cousas futuras do Oriente: Pisando o cristalino Ceo fermoso, Vem pela via Lactea, juntamente Conuocados da parte do Tonante, Pelo Neto gentil do velho Atlante.

Deix?o dos sete Ceos o regimento, Que do poder mais alto lhe foi dado, Alto poder, que so co pensamento Governa o Ceo, a Terra, & o Mar yrado: Ali se achar?o juntos num momento, Os que habit?o o Arcturo congelado. E os que o Austro tem, & as partes onde A Aurora nasce, & o claro Sol se esconde.

Estava o Padre ali sublime & dino, Que vibra os feros rayos de Vulcano, Num assento de estrellas cristalino, Com gesto alto, severo, & soberano, Do rosto respiraua hum ar diuino, Que diuino torn?ra hum corpo humano: Com h?a coroa, & ceptro rutilante, De outra pedra mais clara que diamante.

Em luzentes assentos, marchetados De ouro, & de perlas, mais abaixo estav?o Os outros Deuses todos assentados, Como a Raz?o, & a Ordem concertau?o. Precedem os antiguos mais honrrados, Mais abaixo os menores se assentau?o: Quando Iupiter alto, assy dizendo, Cum tom de voz come?a, graue & horrendo.

Eternos moradores do luzente Estelifero polo & claro assento, Se do grande valor da forte gente, De Luso, n?o perdeis o pensamento, Deueis de ter sabido claramente Como he dos fados grandes certo intento Que por ella sesque??o os humanos, De Assirios, Persas, Gregos & Romanos.

Ia lhe foy concedido Cum poder tam singelo & tam pequeno Tomar ao Mouro forte & guarnecido, Toda a terra que rega o Tejo ameno: Pois contra o Castelhano tam temido Sempre alcan?ou fauor do Ceo sereno. Assi que sempre em fim com fama & gloria, Teue os tropheos pendentes da victoria.

Deixo Deoses atras a fama antigua, Que co a gente de Romulo alcan?ar?o, Quando com Viriato, na inimiga Guerra Romana tanto se affamar?o. Tambem deixo a memoria, que os obriga A grande nome, quando aleuantar?o Hum, por seu capit?o, que peregrino Fingio na Cerua espirito diuino.

Agora vedes bem, que cometendo, O diuidoso mar, num lenho leue, Por vias nunca vsadas, n?o temendo De Affrico & Noto a for?a a mais satreue: Que auendo tanto ja que as partes vendo, Onde o dia he comprido, & onde breue. Inclin?o seu proposito, & perfia A ver os ber?os, onde nasce o dia

Prometido lhe est? do fado eterno, Cuja alta ley nam pode ser quebrada, Que tenh?o longos tempos o gouerno Do mar, que v? do Sol a roxa entrada. Nas agoas tem passado o duro Inuerno, A gente vem perdida & trabalhada. Ia parece bem feito, que lhe seja Mostrada a noua terra que deseja.

E porque, como vistes, tem passados Na viagem, tam asperos perigos, Tantos Climas & Ceos experimentados, Tanto furor de ventos inimigos Que sejam, de termino, agasalhados Nesta costa affricana como amigos. E tendo guarnecida a lassa frota, Tornar?o a seguir sua longa rata.

Estas palauras Iupiter dezia, Quando os Deoses por ordem respondendo, Na senten?a hum do outro difiria, Raz?es diuersas dando & recebendo. O padre Baco, ali nam consentia No que Iupiter disse, conhecendo Que esquecer?o seus feitos no Oriente, Se la passar a Lusitana gente.

Ouuido tinha aos Fados que viria H?a gente fortissimo de Hespanha, Pelo mar alto, a qual sojeitaria Da India, tudo quanto Doris banha: E com nouas victorias venceria, A fama antiga, ou sua, ou fosse estranha. Altamente lhe doe perder a gloria, De que Nisa celebra inda a memoria.

Ve que ja teue o Indo sojugado, E nunca lhe tirou Fortuna, ou caso, Por vencedor da India ser cantado, De quantos bebem a agoa de Parnaso. Teme agora que seja sepultado, Seu tam celebre nome, em negro vaso, Dagoa do esquecimento, se la cheg?o Os fortes Portugueses, que naueg?o,

Sustentaua contra elle Venus bella, Affei?oada aa gente Lusitana, Por quantas qualidades via nella, Da antiga tam amada sua Romana, Nos fortes cora??es, na grande estrella, Que mostrar?o na terra Tingitana: E na lingoa, na qual, quando imagina, Com pouca corrup??o cre que he a Latina.

Estas causas moui?o Cyterea, E mais, porque das Parcas claro entende Que ha de ser celebrada a clara Dea, Onde a gente beligera se estende. Assi que hum pela infamia que arrecea, E o outro polas honras que pretende, Debatem, & na perfia permanecem, A qualquer seus amigos fauorecem:

Qual Austro fero, ou Boreas na espessura, De siluestre aruoredo abastecida, Rompendo os ramos v?o da mata escura, Com impito & braueza desmedida. Brama toda montanha, o som murmura, Rompense as folhas, ferue a serra erguida. Tal andaua o tumulto leuantado, Entre os Deoses no Olimpo consagrado.

Mas Marte que da Deosa sustentaua, Entre todos as partes em porfia, Ou por que o amor antiguo o obrigaua, Ou porque a gente forte o merecia, De entre os Deoses em pee se leuantaua, Merencorio no gesto parecia: O forte escudo ao collo pendurado, Deitando para tr?s medonho e irado.

A viseira do elmo de Diamante, Aleuantando hum pouco, muy seguro, Por dar seu parecer se pos diante De Iupiter, armado, forte & duro: E dando h?a pancada penetrante, Co conto do bast?o, no solio puro: O ceo tremeo, & Apolo de toruado, Hum pouco a luz perdeo, como infiado.

E disse assi, ? padre a cujo imperio, Tudo aquillo obedece, que criaste, Se esta gente que busca outro Emispherio, Cuja valia, & obras tanto amaste: N?o queres que pade??o vituperio, Como ha ja tanto tempo que ordenaste N?o ou?as mais, pois es juyz direito, Raz?es de quem parece que he sospeito.

Que se aqui a raz?o se n?o mostrasse Vencida do temor demasiado, Bem fora que aqui Baco os sostentasse, Pois que de Luso vem, seu tam priuado: Mas esta ten??o sua, agora passe, Porque em fim vem de estamago danado. Que nunca tirar? alhea enueja, O bem que outrem mere?e, & o ceo deseja.

E tu padre de grande fortaleza, Da determina?am que t?s tomada, Nam tornes por detras pois he fraqueza Desistir se da cousa come?ada. Mercurio pois excede em ligeireza Ao vento leue, & aa seta bem talhada, Lhe va mostrar a terra, onde se informe Da India, & onde a gente se reforme.

Como isto disse o Padre poderoso, A cabe?a inclinando, consentio No que disse Mauorte valeroso, E Nectar sobre todos esparzio: Pelo caminho Lacteo glorioso, Logo cada hum dos Deoses se partio. Fazendo seus reaes acatamentos, Pera os determinados apousentos.

Em quanto isto se passa, na fermosa Casa eterea do Olimpo omnipotente Cortaua o mar a gente belicosa: Ia la da banda do Austro, & do Oriente, Entre a costa Ethiopica, & a famosa Ilha de sam Louren?o, & o Sol ardente Queimaua entam os Deoses, que Tife? Co temor grande em pexes conuerte?.

Tam brandamente os ventos os leuau?o, Como quem o ceo tinha por amigo: Sereno o ar, & os tempos se mostrau?o Sem nuu?s, sem receio de perigo: O promontorio prasso ja passau?o Na costa de Ethiopia, nome antiguo. Quando o mar descobrindo lhe mostraua, Nouas ilhas que em torno cerca, & laua.

Vasco da gama, o forte Capit?o, Que a tamanhas empresas se offerece, De soberbo, & de altiuo cora??o, A quem fortuna sempre fauorece Pera se aqui deter, n?o ve raz?o, Que inhabitada a terra lhe parece: Por diante passar determinaua: Mas nam lhe soccedeo como cuydaua.

Eis aparecem logo em companhia, H?s pequenos bateis, que vem daquella Que mais chegada ? terra parecia, Cortando o longo mar com larga vella: A gente se aluoro?a, & de alegria N?o sabe mais que olhar a causa della. Que gente sera esta, em si dezi?o, Que costumes, que ley, que Rei teri?o?

As embarca??es er?o, na maneira Muy veloces, estreitas, & compridas, As vellas com que vem er?o de esteira, D?as folhas de Palma bem tecidas: A gente da cor era verdadeira, Que Phaeton, nas terras acendidas Ao mundo deu, de ousado, & n?o prudente, O Pado o sabe, & Lampetusa o sente.

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