Read Ebook: Ensino intuitivo livro destinado às mães e paes de familia e às professoras e professores de instrucção primária by Telles Jo O Jos De Sousa
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Ebook has 957 lines and 28159 words, and 20 pages
Anjo meu, que barbaros te deixaram aqui abandonado?
E a innocencia vos responder?, n?o com palavras, que as n?o sabe ainda articular, mas com ternissimos solu?os:
Abandonou-me meu pae e minha m?e.
Al?m vae caminho do cemiterio, a tumba, que andou de porta em porta recolhendo os miseros, cujas familias n?o poderam coalhar o bastante para o modesto funeral dos seus parentes.
Fazei-a parar; mandae que a abram; olhae para dentro.
Horror! exclamareis v?s ao ver por entre os adultos exanimes, em sacrilego desarranjo, um bando de crean?as quasi esqueletos, rachiticas, chagadas, meio apodrecidas, com signaes evidentes de terem vindo ao mundo com o estigma da morte profundamente gravado nas frontes innocentes.
Martyres obscuros, podereis v?s dizer-lhes, para quem o mundo n?o teve nem uma cor?a, nem uma palma; estrellas cadentes, que brilhastes um momento e desapparecestes n'um eterno occaso; quem assim vos macerou os corpinhos, e vos deu a beber o fel da morte ao alvorecer da vida?
E a mudez sombria d'aquellas florinhas envenenadas na hastea, e emurchecidas antes de desabrocharem, responder?:
Nossos paes e nossas m?es.
V?des aquelle peralvilho, aquelle afeminado, todo pomadas, todo essencias, gesto insolente, olhar altivo e desdenhoso, que vae rindo e galhofando com outros da sua ral?.
Parou, fazem-lhe roda, applaudem-n'o outros taes. Que bocadinhos de oiro estar? elle a dizer?
Escutae-o.
M?fa da religi?o, que desconhece; insulta os sacerdotes, que acertam de passar junto d'elle; escandalisa as donzellas; zomba dos anci?os; aos pobres, em vez de os esmolar, despede-os insolente.
Indagae como t?o cedo se depravou aquelle mo?o, que deveria estar ainda sentado no banco da escola.
Dir-vos-h?o que ? incuria paterna deve elle toda a sua ruina.
Entrae no templo a presencear as augustas ceremonias, que rememoram a angustiosa paix?o e morte do grande amigo da humanidade.
Que observaes?
A turba irreverente, descomposta, sacrilega, rindo, conversando, ostentando galas, trocando gracejos, costas para os altares, olhares distrahidos, attitudes grosseiras e vilans.
Quantas preces saem d'aquelles labios? Que pensamentos povoam aquellas mentes? Que piedosos affectos existem em tantos cora??es? Escandalisa-vos o desacato? Quereis saber porque na egreja est?o, como n?o poderiam estar na casa da opera?
Chamae de banda um dos levianos e perguntae-lhe o que lhe h?o dito seus paes da grandiosa tragedia do Calvario; do incruento sacrificio, que a representa, da respeitabilidade do altar, do valor das preces humildes e sinceras?
Responder-vos-ha, sorrindo:
N?o vos comprehendo; meus paes nunca me fallaram d'essas coisas.
Que vozearia ? aquella? Porque tantos gritos, tamanho borborinho?
Ergue-se um homem mal trajado, e arenga ? turba.
Poucas palavras tem dito, e j? uns o applaudem phreneticos, j? outros o vituperam enfurecidos.
? o povo soberano, que usa e abusa de seus direitos. A onda encapellada das ruins paix?es sobe, sobe, invade a improvisada tribuna e derruba o Demosthenes improvisado.
Todos fallam, todos proclamam a id?a nova.
Ou?amol-os.
Abaixo os padres, n?o precis?mos d'elles; abaixo a religi?o, que para nada presta; acabemos com a propriedade, os ricos s? querem beber-nos o sangue; viva o communismo, grita um; viva o socialismo, que ? melhor, responde outro; nada, nada d'isso, venha a republica.
Acabemos com os tributos e seremos felizes; e o exercito para que serve? Elimine-se o exercito.
Pedi instruc??o, pedi ensino facil, bom, universal, escolas primarias a cada canto, bibliothecas populares, livros optimos ao alcance de todos no pre?o e no estylo; pedi moralidade, diz com voz firme e sonora um operario, fronte ampla, respeitaveis cans, rosto sereno, m?o calejada pelo trabalho.
F?ra com o visionario brada a turba.
Que quer dizer instruc??o? Para que servem os livros? Para que prestam as escolas? regouga um miseravel, em cujo rosto se retrata a ignorancia e occiosidade; e bradando ? turba, ap?s si a leva can?ada, mas n?o saciada de disparatar.
Dirigi-vos ao operario honesto e prudente e informae-vos de quem sejam aquelles doidos.
Uns infelizes, dir? elle, bons cora??es, m?s cabe?as. Pobresinhos todos; por?m mais pobres de instruc??o que de dinheiro, porque todos tem aptid?o para o trabalho, mas a todos faltou a educa??o. N?o tiveram paes, como eu felizmente tive, que os mandassem ensinar. A m?r parte nem ler sabem, nem fazer o seu nome. Se lhes fordes perguntar o que seja republica, socialismo, communismo, salario, religi?o, exercito, ? boa f? vos affirmo que n?o poder?o responder coisa que geito tenha.
Mas deixemos estes homens, nem todos maus; muitos bonissimos, desvairados pela febre ardente de antigos e profundos padecimentos, que buscam a verdade e o bem, como os alchimistas da idade media, por meios absurdos e inconvenientes, mas que tem a coragem de affrontar os perigos, de sacrificar a propria vida, e de soffrer com a resigna??o dos martyres dos primeiros seculos do christianismo esses hediondos supplicios, a que ainda hoje o mundo civilisado assiste com profunda magoa e indigna??o.
Volvamos os olhos para aquell'outros.
D'onde vem?
Das enxovias.
Para onde v?o?
Para o degredo.
Homens, mulheres, crian?as! Deixam a patria, os amigos, as familias, os formosos campos, onde nasceram, este c?o t?o puro, este sol t?o esplendido, este clima t?o amoravel, este aben?oado e feracissimo torr?o, para irem em paizes inhospitos luctar com a morte opprobriosa, ralados de saudades, roidos de remorsos, despreziveis aos olhos de todos, e condemnados pela voz implacavel da propria consciencia.
V?m alli assassinos, sacrilegos, perjuros, fratercidas, patrecidas, ladr?es, incendiarios; todos os crimes, todas as torpezas, todas as infamias, o lodo asqueroso de todas as humanas miserias, as trevas da ignorancia preversa, a lepra do grande corpo social.
Ponde os olhos n'aquelle quadro, m?es e paes.
N?o interrogueis os que o crime despenhou; n?o insulteis a desgra?a; n?o amargureis mais aquelles cora??es devastados e corroidos pelo crime, onde poder? haver ainda alguma fibra incorrupta e sensivel; mas perguntae a v?s mesmos que educa??o receberam aquelles miseros de seus progenitores? que sorrisos e carinhos lhes cercaram os ber?os? que palavras ouviram aquelles entes ao entrar na vida? que exemplos tiveram para seguir? quaes as escolas, a que os mandaram? que affectos semeiaram n'aquelles cora??es? quantas vezes lhes apontaram para o c?o e lhes fallaram de Deus? que no??es lhes deram da verdade, da justi?a, da honra, do dever? que meios empregaram para lapidarem aquelles diamantes? que processo adoptaram para desinvolver-lhes a intelligencia?
E se n?o acertardes com as respostas a estas e a muitas outras perguntas, que o caso suscita, ide-vos por essas cidades, e villas, e aldeias, e povoados e indagae a historia de cada um d'aquelles infelizes. Raro achareis que se prevertesse o que dos paes houvesse recebido desvelada educa??o.
Mas o que ? educa??o desvelada?
Eis o ponto importantissimo, para o qual cham?mos a atten??o de todos. N?o o desenvolveremos aqui. Assumpto ? para um livro, e j? larga e proficientemente tratado por grandes mestres da sciencia de educar.
Diremos apenas, que muitos paes e mestres ha, por desgra?a nossa e d'elles, que n?o comprehendem nem a extens?o, nem a intensidade da palavra educar.
Para uns educar ? crear, ? nutrir o animal, ? desenvolver-lhe o physico; e nem sempre conforme os dictames da medicina e da hygiene.
Para outros educar ? iniciar a crian?a nas regras mais elementares da leitura, da escripta, da contabilidade e de uma arte ou officio.
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