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Ebook has 42 lines and 2296 words, and 1 pages
JAIME DE MAGALH?ES LIMA
SALMOS DO PRISIONEIRO
COIMBRA.
F. FRAN?A AMADO, EDITOR.
Salmos do Prisioneiro
Composto e impresso na Tipografia F. Fran?a Amado, rua Ferreira Borges, 115--Coimbra.
Jaime de Magalh?es Lima
Salmos do Prisioneiro
COIMBRA
F. FRAN?A AMADO, EDITOR
Mentiu-me a liberdade, foi blasfemia! Foi engano, foi ilus?o, e atrai?oou-me, atrai?oando a f? que me d? a vida!
Vou levado de rastos neste mundo, guerreiro que nasci para ser vencido. Se movo o bra?o para combater por sonhos arrojados que o levantem, logo o sujeitam e mo fazem escravo as pris?es de que em v?o tento livrar-me--pris?es de amor, aben?oado carcere, onde sofre e se alegra o cora??o, onde se humilha pr?so a toda a terra e onde se exalta erguido a c?us eternos e ao Deus que rege a terra e rege os c?us.
A piedade, a d?r, remorso e f?, perd?o, esperan?a, a esmola e a contric??o, e a ilus?o e a m?goa e o desengano, tremores da consci?ncia que d?vida, as l?grimas de afecto e aquelas outras, candentes e de fogo, em que o ?rro chorou arrependido; e o sil?ncio, que eu temi, que eu amei e que busquei para todo me entregar ao seu poder; e a mudez que diz mais que a voz mais alta, e a sedu??o da morte, quanto anseio a minha alma pressentiu;--e quanta formosura nos afaga e quanta sombra nos aterra e prostra, a ?gua clara do regato l?mpido, a luz do dia, a verdura do prado, e toda a austeridade da montanha, severa, grande e rude, imperturb?vel, e o inflamado terror da tempestade, e o mar e as suas ondas tormentosas, e os p?mos rescendentes de perfume; a rosa, e a crian?a; e os olhos que fascinam; e a gra?a que incarnou na juventude, e a nobreza que ? a gra?a de velhice:--venceram-me, prenderam-me!...
E sempre que me ergui para libertar-me, sempre escravo ca? do seu encanto; e no meu peito ouvi salmos de amor, louvando os ferros que o apertavam e louvando o Senhor que lhos mandava; e o meu peito os cantou e repetiu, sorrindo ? sorte que o rendeu cativo.
Da l?vida tormenta, que em nuvens repassadas do seu luto turva o dia amoroso de setembro, cai s?bre a terra a chuva maternal a dar seu leite ?s seivas minguadas e a dar aos p?mos tumidos a un??o de um derradeiro e salutar frescor.
Real?a na levada alvas espumas; redobra no a?ude o seu cantar; banha em cristal a rama dos carvalhos; a veiga reverdece; e o pinheiral, que ?l?m sofria a s?de entre os penhascos donde, heroico, brotou a desmentir-lhes sua infecunda aspereza abandonada, serenamente bebe o refrig?rio, como sofreu sereno a crueldade da ard?ncia do estio prolongado, seus ramos apontados ?s estrelas, quer pade?a tormentos, que se exalte em bens das suas horas mais felizes,--por certo vendo amor que n?s n?o vemos, mas que em suas esmolas n?s sentimos, na sombra, na fogueira e na choupana, no tecto dos casais e s?bre as ?guas, salvando do naufr?gio os desvairados filhos de cobi?a.
Ao longe, o tra?o agudo das montanhas cortando a seu capricho os horisontes, seus p?ncaros audazes e a profundeza das suas largas sombras misteriosas; e as ermidas onde vivem, guardadas da corrup??o do mundo e da mentira, a f? e a singeleza; e os castelos onde em ruinas penam as vaidades e as ilus?es do orgulho e fortaleza--todos dos nossos olhos se perderam na confus?o das nuvens insond?veis, todos por sorte igual j? se ocultaram na pl?cida cinza humedecida que brandamente os cobre em seu repouso.
Depois, dissipada a tormenta, veloz em seus errores transpondo os montes, um sil?ncio velado lhe sucede; e no ca?r da tarde, magoada de sombra e de mudez, ressurgem as ermidas e castelos, as montanhas e os cerros mais erguidos, casais, verduras, relvas e florestas, renascidos para a vida e formosura na ben??o baptismal de ?guas lustraes.
Mas agora, por toda a vastid?o da serrania, docemente vagueiam sonhos de candidez. Beijando o ch?o, pousou ali a alvura de nuvens desprendidas da procela, como se os c?us quizessem ser humildes, mandando ? terra anjos de pureza e bondade e caridade, a cobrir-lhe a aspereza misera e cruel, seus cardos e os espinhos mais agudos, e o nosso desamor, nossa trai??o aquele eterno Pai que nos criou, mais negra e mais cruel que a avareza da terra a mais ingrata.
E a minha alma prendeu-se nessas nuvens, com elas rastejou meu cora??o, esmolando dos c?us que o redimissem naquela alvura em que remiram os montes e os cardos e os espinhos mais agudos!
Quando a saudade me repete as horas de inf?ncia e candidez, ha longos anos j? contadas e passadas, e sempre t?o presentes, renovadas na obsess?o de sonhos procurando um reino de pureza onde n?o chegue o desengano amargo deste mundo que nos perturba a f? e o pensamento, renascem aos meus olhos claramente quantas sombras ent?o me protegiam, quantas ?rvores ent?o f?ram afago do despertar das minhas ilus?es e das alegrias em que me sorriam. Todas as vejo e todas me repetem a sua formosura e o seu encanto, tais quais nessa alvorada me encontraram, amando-as com um amor que s? cresceu, intemerato, isento, incorrupt?vel, sofrendo v?ria sorte sem mudan?a, a sorte mais contr?ria e a mais benigna. Em todos os meus passos me seguiu: foi amparo na d?r e acompanhou-me no mais rude trabalho, e no repouso, e na alegria de descuidados dias de ventura.
Aquelas mesmas ?rvores que amei e o acaso funesto destruiu para consumarem um heroico holocausto de bondade, essas mesmas eu vejo na lembran?a, serenas e vi?osas como as vi quando o meu cora??o as descobriu.
L? ao fundo da encosta, onde a floresta acaba e vem o prado, ainda vejo, do alto do casal que me agasalhava, toda a espessura do pinheiro manso, a marcar o extremo do valado, cerrada e firme, qu?si insens?vel ao vento tormentoso dos invernos, e t?o estreitamente unida e igual que pareciam tomadas de amizade as hastes apertadas para viverem seu diferente viver em uma s? vida, a cumprirem fielmente um juramento, para afrontarem juntas o rigor e para juntas se erguerem em exalta??o--comunidade m?stica de afecto, religioso c?ro de louvor, a entoarem seus hinos recitados, em severa harmonia, por um s? brevi?rio.
E ? tarde, quando o sol deca?a e as formas se afundavam no crep?sculo, e de manh?, quando rompia a luz ?l?m dos montes e a custo ia acordando o salgueiral, a v?rzea e as amieiras, e ainda quando ela em nuvens se perdia e melancolicamente transformava em palidez e sombra o meio dia, sempre dos ramos do pinheiro vinha uma emana??o doirada resplendente, como se o sol ali pousasse sempre, j?mais o abandonasse ? escurid?o, e o defendesse, para que por sua vez a ?rvore nos desse, perpetuamente, aquela mesma luz que o sol lhe dava e nunca se apagava nos seus ramos.
A pobreza dos homens h? muito arrancou j? daquela terra, que esplendidamente engrandecia, o pinheiro rebusto a cuja sombra a minha mocidade, cativada de todo o seu pod?r e magestade, muitas vezes pediu que lhe dissesse o segredo da sua aspira??o e o mist?rio da sua formosura. H? muito ? cinza e p? e ao p? volveu, sacrificado a chamas piedosas. Mas a perene claridade dos seus ramos que, constante, o doirava em doce esmalte, ou o sol brilhasse alto ou se ocultasse, ?sse sonhar do sol que ali pousava e nunca se extinguia, ?sse n?o se apagou nem dissipou e ?sse me prende ainda e me fascina. Vive nos c?us onde as estrelas vivem; de l? nos ilumina e guia em nossa estrada; perpassa et?reo em toda a imensidade repetindo-me os salmos que eu ouvi aos ramos do pinheiro murmurando sua ardente ora??o ? luz do sol.
Prendeu-me a rola sob a sua aza. Ao sentir-lhe a car?cia desarmou-me de vontade e firmeza que, estando em mim, n?o mais me pertenceram. Cegou-me a c?r morena do seu colo. Sua voz, seu olhar... foram algemas.
Prendeu-me aquela rola do pinhal que balou?ada ao vento, l? no cimo dos ramos mais subidos da floresta, ali canta e se alegra e dali parte cortando o sil?ncio umbroso adormecido na sonol?ncia ardente do estio, ora erguendo seu v?o ? luz do sol, ora airosa pousando tranquila, ora fugindo porque algures pressente um logar mais prop?cio ao seu desejo.
Prendeu-me essa outra rola que em meus la?os por minha arte ca?u no cativeiro, a desprendida monja resignada que resa o seu ros?rio ? madrugada e o repete ao luar em seus gemidos, mensageira bemdita do perd?o que a mim, seu carcereiro! me sa?da na brandura amorosa dos arrulhos, quando ao romper da aurora eu a visito e, confiada, me vem pousar nas m?os, aquecendo-me o sangue com o seu sangue.
Por que gra?a de Deus ou por que esmola, por que estranha indulg?ncia consentiste, rola cativa, minha doce serva, que em minhas m?os eu prenda as tuas azas, te beije o peito e o toque a boca impura que murmurou ?rro, mentira, a maldade, a descren?a e a impiedade?!... Porque quiz?ste que assim se amassem e vissem nossos olhos, os teus que s?o a vida e a candidez, e a ternura sem mancha do teu ninho, e os meus que s?o a morte e a escurid?o, e o desejo sinistro e o remorso que uma dorida consci?ncia acusa?!...
Oh, mansid?o, apari??o ang?lica, mandada a este mundo de treva a alumiar-nos a estrada que a Deus conduz e Deus tra?ou!... S? de sonhar prender-te, j? me prende a pr?pria tenta??o de te prender.
Verteu outubro suas c?res de outono, purpura e oiro, nos c?us do poente em que o sol se perde. Melanc?licamente a luz abranda. Coroada de viol?tas, a saudade chora entre brumas sua infinda m?gua.
Cresce do mar a nevoa setinosa; o ardor adormece em suavidade. E t?o carinhosa a nevoa nos afaga na repousada sombra da sua paz que mais a sedu??o da morte nos anseia do que a tenta??o da vida nos exalta.
Ao rubor do poente, repetindo-o, responde o rubor da vinha debru?ada da muralha a que confia o seu arrojo. Sentindo que o inverno j? n?o tarda, portador de agonias e rigores, incerta de viver, corou juntando o sangue para gloriosamente o dar ? morte.
Erradia, tenaz, afoitamente, no delirio da sua caridade, cobriu de pampanos as est?reis rochas, deu-lhes o manto da sua verdura. Beijou-lhes a dureza e aviventou-a. Humedeceu a ?rida secura, insinuou-lhe tumidas raizes onde vagueia a aspira??o da seiva. E agora humildemente vae despir-se, vae dar ? terra suas grinaldas em um derradeiro clamor ardente. A essa m?e de todo o amor as abandona para ? luz da primavera renascer e em estos de verdura ressurgir da sev?ra mudez a que a condena toda a rudeza agreste de dezembro.
Ao sopro turvo da primeira rajada de novembro, o pampano vermelho empalidece. Desprendendo-o da haste, o vento leva-o, rolando-o pelo ch?o e consumindo-o. Um murmurio de d?r lhe canta a morte e um murmurio de esperan?a a aben?oou. Est? despojada da opulencia a vinha. Acende-se em seu seio e vem surgindo o sonho d?sse vi?o que desponta quando a aurora de abril lhe solta a aza.
Folhas mortas, ca?das, desmaiadas e dispersas pelas fr?gidas brizas de novembro! Em que la?os de morte me involvestes, prendendo ? vossa sorte o meu scismar!...
Tamb?m tu, serp?o do monte, me prendeste, tamb?m tu me roubaste a liberdade! Singelamente, floriste em flores onde a c?r da violeta empalidece e rediz seu poema de ternura. Assim me possuiste e ? tua pequenez me acorrentaste, ?quela pequenez que para mim foi grandeza e voz divina ao desprender da humildade e modestia os mais perfeitos perfumes, os mais doces.
Urna de incenso para ungir o ch?o, vaso quebrado entornando a ess?ncia que o nardo e a mirra e o cinamomo e o galbano n?o negariam, se Deus lhe d?sse a escolha! Em teu poder sonhei reinos fulgentes e bibl?cas vis?es me arrebat?ram.
Ao v?r-te entregue ? fria ingratid?o e ao desamparo dos montes e dos c?rros mais despidos, partilhando os rigores das urzes t?midas que em sua purpura ocultam a gandara negra; escravo sem sustento abandonado em solid?es av?ras por quem te qu?s coroar no sofrimento; sem o abrigo de uma s? ?rvore, sem o consolo do mais tenue fio de ?gua que entre as pedras banhasse e convertesse a aspereza em limpidez; resignado filho trasmudando em do?ura suprema a austeridade que o gerou e o castiga despiedosa--na tua vida sonhei terras distantes onde se ergueu a cruz e Cristo orou na paz, entre oliveiras, pedindo ?quele que o mandou e est? nos c?us que s?mente a sua vontade se cumprisse. Estranha evoca??o me segredou que era assim a terra santa do Calv?rio--no ch?o o mais severo, a do?ura infinita; e no martirio, o amor.
Dos teus ramos t?o d?beis que rastejam e condi??o mais alta n?o procuram, porque s? na humildade est?o contentes, fiz o rasto do pr?prio cora??o onde o senti pulsar em ardor que o acordasse e erguesse para o sagrar. Por te amar, fiz de ti sinal de amor. Em meus tesouros, ricos de lembran?as, marcas iluminadas folhas
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